quinta-feira, 8 de agosto de 2013


Wonders of Life (Brian Cox, físico de partículas), What's Life (Erwin Schrödinger, físico) e Status Anxiety (Alain de Botton, filósofo): três livros que na minha história pessoal se juntaram numa salada particularmente estimulante, ponto de partida para um trajecto de considerações curioso. Achei interessante partilhá-lo. Se o leitor tiver algo de mais interessante para fazer, fique por aqui. Se for amante de um exerciciozinho teórico, ou insone, continue comigo.

Os três vectores directores da vida - a conservação (homeostase, metabolismo, crescimento), a adaptação a estímulos do meio e a propagação do material genético - são tão antigos quanto a própria vida em si (qualquer coisa como três mil e setecentos milhões de anos). Mesmo com o extraordinário desenvolvimento cerebral da nossa espécie, continuamos reféns absolutos.
Mas é por causa deste extraordinário desenvolvimento cerebral que a propagação do material genético adquire manifestações tão distintas. A pulsão milenar da reprodução é ubíqua mas metamorfoseou-se em dezenas de outras. Foi sempre uma competição: estamos programados para deixar a maior descendência possível e eliminar a alheia. Por isso deitamos mão aos melhores instrumentos com que a inteligência e a era nos brindam; instrumentos que nos distingam dos outros, que nos comprem atenção, reverência, aceitação - amor. Lutarmos por carreiras com destaque social e proveitos financeiros gordos é procurarmos uma posição melhor do que a do vizinho do lado. Almejar um carro melhor do que o desse vizinho é procurarmos chegar à frente na fila. Ou vestir roupa desta marca, passar férias naquele sítio, aparecer naqueloutra festa. Sempre meios, nunca fins em si mesmos.
 
Na nossa espécie a inteligência sobrepôs-se à força. Não sei se é uma estreia mas é certamente pouco frequente; ao longo da árvore filogenética a norma é outra. Tornámo-nos a única espécie do género Homo não pela força das fibras musculares mas pelo poder do córtex cerebral. A caminhada que iniciámos há cento e cinquenta mil anos foi a caminhada do intelecto. A capacidade de manipular o ambiente e os outros tornou-se a força definidora da posição social que ocupamos e o macho-alfa deixou de o ser por ser mais alto, mais forte ou mais rápido. Lidera quem tem o maior intelecto e o transmite pela acção - normalmente da palavra.
 
Isto é terreno fértil para a frustração. Se sou grande, forte, deveria ser um líder nato. É  o que acontece nas outras espécies. Porque é que sou subalterno? Porque é que sigo em vez de liderar? Calar o instinto primordial de tamanho-é-poder não é fácil.
A invenção setecentista da meritocracia também não ajuda, tão arreigada que está. Posso-ser-o-que-quiser. Com-trabalho-consigo-tudo. Toda-a-gente-pode-ser-líder. Lamentavelmente, não. Se fossemos todos líderes não restaria ninguém para liderarmos o que inauguraria, por si só, um paradoxo.

Sem comentários:

Enviar um comentário