domingo, 5 de janeiro de 2014


Há algo anacrónico e lúgubre num espectáculo de circo. O fascínio pelo domínio duma arte física continue tão vivo em nós como nos públicos vitorianos, mas o que era novidade no século dezanove dificilmente o é em dois mil e catorze. Os circos deixaram de ser há muito os únicos palcos onde podemos admirar piruetas arriscadas e senhoras de maillot - basta uma ligação à internet.
O mais sinistro são mesmo os palhaços. Quando era miúdo havia sempre um palhaço triste e um palhaço contente. Hoje em dia acho-os todos tristes. Porque o humor é humilde e estafado; porque os desgraçados, muitos com idade de avô, passam o dia maquilhados com tintas cancerígenas; porque a maior parte vive numa pobreza miserável anestesiada à custa de bebida.
Há nestes espectáculos toda uma cultura de desrespeito que me faz espécie. Pôr um homem de meia idade a repetir palermices de cara pintada, ou um ginasta dorido a replicar os mesmos pinotes vezes sem conta, ou a partenaire dum mágico a surpreender-se com o truque de sempre é rebaixá-los. Não consigo deixar de pensar que de cada vez que repetem a rotina vendem um bocado da alma. Não é coisa que me apeteça aplaudir.

1 comentário: