quinta-feira, 27 de março de 2014


R está contente.
R está a preparar a casa para uma tarde de sexo vigoroso, arrumando as várias divisões com brio porque R sabe que vai ter sexo em todas elas.
Dez minutos antes da hora combinada entre R e a companheira batem à porta duas septuagenárias para falar com R sobre Deus. Embora atarefado, R é bem formado e não gosta de despachar quem lhe bate à porta, especialmente velhinhas. R pergunta então sobre que deus é que as senhoras querem falar; as senhoras entreolham-se numa expressão confusa; R sugere a mitologia nórdica. As senhoras decidem voltar noutra altura. R despede-se com amizade e volta à lide caseira.
R está contente.

domingo, 23 de março de 2014


Corte e limagem das unhas dos pés no leito conjugal

indesculpável decaimento dos padrões de conduta doméstica
ou
enternecedor testemunho de transparência e confiança?

quarta-feira, 12 de março de 2014


Atentem na excelência do momento que acabei de viver. Na cafetaria duma conceituada instituição de ensino superior estão dois indivíduos debatendo em inglês com um terceiro, numa carregada pronúncia germânica, a intolerável situação que têm vivido em Portugal como doutorandos em Física. O que mais os chocava era a aparente incapacidade dos locais comunicarem em alemão. Um sinal inequívoco de atraso cultural e provincianismo. Porque a Alemanha é a Europa e a Europa é a Alemanha (sic).
É refrescante perceber a transversalidade da imbecilidade.

sábado, 8 de março de 2014

 
A Phillip Island's Penguin Foundation está a pedir camisolinhas de lã para vestir os pinguins que estão a recuperar do contacto com óleo de derrames. Palavra que estou a ponderar aprender a tricotar só para esta ocasião.
 
 
 

quinta-feira, 6 de março de 2014


Fiz anteontem parte do público dum fulano, orador profissional, que debatia a dada altura maneiras de estar na vida. Goste-se ou não do registo pensa-assim-sente-assado sempre se colhe uma ou outra ideia válida de maneira que lá estava eu, não propriamente contra gosto mas com surpreendente dificuldade em embarcar naquela retórica entusiasmada.
O conteúdo era lógico e relevante mas algo na forma estava a manter-me à distância. Não era uma sensação nova, curiosamente, e pus-me à cata da raíz.
É difícil aderir a um discurso que recorre exaustivamente à metáfora, é a conclusão a que cheguei. Nada contra figuras de estilo enquanto exercícios de ênfase, entenda-se; uma hipálage que ajude a traçar um sujeito - óptimo; uma sinestesia que lhe dê contraste - excelente; um oxímoro que o absurdize - magnífico. Mas com peso e medida. O que aconteceu nesta ocasião, e tão amiúde noutras, foi o exagero metafórico. Quer na frequência quer na falta de subtileza. A metáfora demasiado literal empresta definitivamente à mensagem um tom ou bacoco ou paternalista. Revela a parca finura intelectual do orador, que não é capaz de produzir nada mais subtil, e exaspera os ouvintes, que se sentem inferiorizados pela desadequação do tom.
A evitar.